O campo da memória, e inclusive da própria comunicação organizacional, nutre-se de uma inspiração rizomática, porque se desenvolve numa diversidade de interfaces. O rizoma é apresentado como multiforma, uma haste subterrânea com ramificações variadas de superfície e com bulbos ou tubérculos, e neste sentido superando a visão de raiz, de ponto único de eclosão. A memória postula justamente a multiplicidade e a convivência de diversos sujeitos, que reconstroem experiências passadas, a luz ou não das intenções do presente. Isto combina imensamente com os princípios desta nova concepção de comportamento e inteligência: “as multiplicidades são rizomáticas e denunciam as pseudo multiplicidades arborescentes [que] não têm sujeito nem objeto” (DELEUZE; GUATTARI, 1995, p.15).
A metáfora do mapa é empregada pelos autores e apresenta sintonia com a memória como algo conectável em todas as direções, desmontável, reversível e suscetível a modificações, visto que, “uma das características mais importantes do rizoma talvez seja a de ter sempre múltiplas entradas”. Não combina, portanto, com os sistemas pensados a partir da árvore ou da raiz, porque estes são hierárquicos e comportam centralidades. Assim como a memória, o rizoma não é feito de unidades, mas de dimensões; não tem começo nem fim, mas sempre um meio pelo qual cresce e transborda e, nesta perspectiva, ambos têm como tecido a conjunção ‘e’, não excludente (bem ao contrário da tendência ocidental de aplicar “ou” sobre as coisas).
As bases conceituais de História Oral são preciosas nesta perspectiva de fazer brotar as histórias de todos os pontos da organização. O olhar sobre a História Oral seria de um processo viabilizador da captação, registro e disponibilização da narrativa em uma organização. É desta área do conhecimento que está inspirada a ‘Tecnologia Social da Memória’ como base para planejamento, captação e registro do storytelling. Tecnologia social da memória é um conjunto de conceitos, princípios e atividades que ajudem a promover iniciativas de registro de memórias e a ampliar o número de autores na História. Foi organizado em forma de metodologia conjuntamente pela Fundação Banco do Brasil e pelo Museu da Pessoa entre 2005 e 2009. Neste ínterim, assume-se que: “definir o que é história é também histórico, isto é, depende da época, da ideologia e dos objetivos de quem define. Mas é certo que todas incluem a produção de uma narrativa. De fato, o que fica da História são sempre narrativas, sejam elas produzidas por atores presentes ou passados” (FUNDAÇÃO…, 2009, p.11).
Segundo a literatura da área, há cinco formas principais de narrações: 1) narrativas de vidas públicas, em que políticos, esportistas e artistas contam suas histórias fixados numa imagem a ser zelada, marcadas por factualismos e pouca introspecção, com total foco nas atitudes públicas e não na experiência privada, com forte negociação de discurso; 2) figuras que leem as próprias histórias contadas de maneiras épicas, com evocação de modelos de guerreiros, santos, figuras mitológicas ou personagens de romances; 3) narrativas de vidas trágicas, vindas de pessoas doentes, malsucedidas ou com problemas traumáticos, com desenvolvimento de um relato dramático e ocorrência de choro; 4) narrativas cômicas, com dose exagerada de humor, num estilo de domínio sobre a evocação e numa condução crítica em relação à sociedade e com algum descontrole sobre o entendimento sequencial do relato; e 5) narrativas misturadas, fazendo composição de alguns formatos anteriores.
Fontes indicam que há três etapas para a realização de um projeto de storytelling, a saber: construir histórias, organizar histórias e socializar histórias (FUNDAÇÃO…, 2009, p.16). Primeiro, o grupo é estimulado a produzir narrativas, coletar documentos, fotos, objetos e identificar espaços e construções que considere parte de sua história. Da história individual à história coletiva, o grupo pode usar diferentes ferramentas (entrevistas, rodas de histórias, linhas do tempo, coleta e seleção de objetos, fotografias) para produzir registros que se tornem fontes e referências de sua história. Depois, para que os conteúdos registrados e coletados possam ser utilizados, é necessário organizar a história produzida. A ideia é permitir que o usuário acesse e relacione os conteúdos e estabeleça conexões entre eles. Então, o ciclo se completa quando o conteúdo produzido é socializado. Toda história pressupõe interação social.
O desafio do comunicador é exatamente estimular a eclosão de histórias, analisar sua representatividade diante dos valores organizacionais, organizar seu conteúdo e difundir como mensagem de inspiração. Veja o caso da Caterpillar (vídeo abaixo em inglês): durante anos, a área do norte de Madagascar não tinha vias navegáveis que se estendessem para o sul, deixando 320.000 pessoas na ponta norte da ilha isolada do resto do país. Com a ajuda do revendedor Caterpillar Henri Fraise, uma grande rodovia foi finalmente construída – Route Nationale 6 – conectando a este povo a oportunidades de empregos, educação e cuidados médicos. Esta é uma forma de apresentar produtos de infra-estrutura e competência tecnológica da marca, mas transcendendo sua atuação para os benefícios de sua existência. Sai da dureza do papo sobre negócios para o envolvimento da ação empresarial dirigida ao desenvolvimento social. Sim, eles têm lucro com isto, mas entendem sua responsabilidade muito além.