A importância das áreas de comunicação e relações públicas talvez nunca estiveram tanto em evidência como neste momento, em que toda a sociedade enfrenta rápidas e significativas mudanças em decorrência da pandemia do novo coronavírus.
Um dos setores mais sensíveis neste momento é o hospitalar, e para entender melhor este cenário nós conversamos como o Fernando Carara Lemos, coordenador de comunicação corporativa da Associação Educadora São Carlos (AESC), mantenedora de uma rede de hospitais no Rio Grande do Sul.
A AESC é responsável pelo Hospital Mãe de Deus e Santa Ana – ambos em Porto Alegre; Santa Luzia – em Capão da Canoa; e o Nossa Senhora dos Navegantes – em Torres. Além de quatro Centros de Atenção Psicossocial de Álcool e Drogas (CAPS AD), três colégios e um Centro de Atendimento ao Migrante.
Formado em RP (ConrerpRS/SC 2397), com MBA em Gestão Empresarial e Mestre em Comunicação Organizacional, Fernando também atua como conselheiro do Conselho Federal de Relações Públicas.
Confira na sequência a íntegra desta entrevista.
1) Qual fato marcou a virada de chave no posicionamento do hospital? E como isso impactou a mudança de rotina de trabalho da equipe de comunicação?
Todos os nossos serviços foram diretamente afetados desde que iniciaram os casos no Rio Grande do Sul. No caso do Hospital Mãe de Deus (HMD), desde janeiro já existia um comitê formado por integrantes de diversas áreas, que vinha observando a evolução do Novo Coronavírus, e já traçando iniciativas para preparar a estrutura quando o vírus chegasse em Porto Alegre.
Nós, da Comunicação, começamos a participar em fevereiro das reuniões. Foi no final da primeira quinzena de março, quando tivemos nosso primeiro atendimento no hospital, que foi a virada de chave.
Neste mesmo período, iniciou a política de isolamento do governo e praticamente todo Centro de Serviço Compartilhado da AESC foi direcionado para o teletrabalho. Somos uma equipe enxuta de comunicação (em Porto Alegre, somos seis, e mais duas pessoas em Caxias do Sul) e prestamos atendimento a todas as unidades.
Em Porto Alegre, três colegas foram trabalhar de casa, eu e mais a responsável pela comunicação do HMD passamos a atuar diretamente no Hospital, com a participação presencial do nosso colega de comunicação digital em alguns dias.
Montamos um QG no auditório e de lá fomos trabalhando na produção de conteúdo para os diferentes públicos (médicos, funcionários, sociedade, governo, imprensa, etc), incluindo um estúdio para produção de vídeos.
2) Houve algum plano de crise? Qual a importância de ter ações/procedimentos previamente pensados?
Desde o início tínhamos uma intenção muito forte: destinar toda atenção à Covid-19, sem deixar de estarmos preparados para continuar o atendimento a pacientes que nos procurassem em decorrência de outras enfermidades.
Este era o foco das ações apresentadas pelas diferentes áreas. A segurança de ações bem estruturadas foi essencial para atuarmos na comunicação com os diversos públicos.
3) Como os relacionamentos são pensados nesse contexto?
O novo coronavírus exige de todos o que, de certa forma, estávamos em falta: capacidade de nos relacionarmos, de confrontarmos pensamentos diferentes.
Temos que confiar mais nas pessoas, nos profissionais que estão conosco; entendermos que as realidades de cada instituição são diferentes; que em momentos como este, a cooperação de organizações até então concorrentes é essencial para fortalecer o sistema num todo.
No Mãe de Deus houve espaço para as lideranças atuarem internamente e houve o movimento, de diferentes setores, de criarem redes de compartilhamento de experiências com profissionais de outros hospitais da cidade, do estado, do país e do mundo.
4) Qual o maior risco que um setor de Comunicação de um hospital corre? O que não pode errar?
A validade da informação em tempos de incerteza. O que é certo hoje, amanhã já pode mudar, ou estudos científicos publicados com propostas diferentes para um tratamento.
Somado a isto, estamos trabalhando para combater algo, de certa forma, desconhecido, o que resulta no surgimento de diversos experts, sempre prontos a criticarem.
Além disto, o hospital não para, é 24 horas, 7 dias por semana. São muitos sentimentos: do paciente, dos familiares, dos profissionais, e qualquer informação precisa ser pensada de forma crítica para que possa ser compreendida da melhor forma por quem está consumindo ela, pois a comunicação tem a capacidade de diminuir ou aumentar a ansiedade das pessoas.
Sobre o erro, vejo de uma forma diferente: somos humanos vivendo num cenário atípico, um contexto que incentiva erros. Nosso cuidado e responsabilidade é com uma revisão ainda mais apurada, confiança nas fontes, e, se por algum motivo, algo sair errado, temos que ter a agilidade de corrigir e reconhecer o erro, e aprender com ele.
5) Qual foi o maior aprendizado até agora? E qual a dica você daria para profissionais que estejam nessa situação, ou passem por ela algum dia?
A nossa resiliência é construída com o suporte do próximo. Não fazemos nada sozinho, principalmente comunicação.
Podemos entender muito bem de estratégias, canais, mas se não conseguirmos ouvir o outro, em especial quem queremos envolver na comunicação, ficaremos apenas jogando informações ao vento.
6) O que mudou no que você pensa sobre o papel do RP?
Apenas reforçou o que penso: vivemos num momento em que nosso papel enquanto profissionais que possuem a formação para atuar com relacionamentos por meio da comunicação é cada vez mais essencial para o sucesso das pessoas, das empresas e da sociedade. Há um bom tempo que o relacionamento passou a ser a alma dos negócios.
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