No último sábado eu acompanhava no SporTV o jogo entre Finlândia e Dinamarca, pela primeira rodada da Eurocopa. Com torcida no estádio, o clima era de festa. Mas aos 41 minutos do primeiro tempo o jogador dinarmaquês Christian Eriksen cai sozinho desmaiado no chão.
As cenas seguintes, televisionadas ao vivo, foram de extrema angústia. Um atleta de alta performance, de apenas 29 anos, sendo reanimado por longos minutos. Para quem não viu falar sobre o assunto, já adianto que Eriksen foi levado ao hospital consciente e estável para ser submetido a uma bateria de exames – UFA!
O fato tão delicado e repentino põe à prova o preparo das marcas para lidar com situações como esta. Em especial, me refiro aqui à conduta do canal SporTV.
E abro um parênteses: compreendo que o assunto poderia ser objeto de uma análise sob a ótica de princípios jornalísticos. Mas enquanto relações-públicas, faço a análise a partir do que acredito ser a prática recomendação de uma comunicação em momento de crise.
Ponto positivo: a condução da narradora Renata Silveira
Renata soube dar o tom certo à transmissão. Visivelmente abalada e emocionada, teve a capacidade e a sensibilidade de lidar com uma situação totalmente atípica à sua rotina de narradora e jornalista esportiva.
Tem até um texto no Buzzfeed repercutindo exclusivamente a condução da Renata. Caso queira ler, aqui o link. A repercussão na internet foi de reconhecimento a ela e seus companheiros de transmissão: Ana Thais Matos e Paulo Nunes.
Sem intervalos: informar ou cuidar dos seus?
Chamou a atenção que a direção do programa o manteve no ar por horas a fio. A audiência, que certamente aumentava a cada minuto, chegava buscando por informações. Mas era nítido que a equipe da transmissão precisava de um intervalo para aliviar a tensão e retomar o fôlego.
Perderia audiência? Talvez sim, um pouco. Mas o que importa mais? Cuidar dos seus profissionais é uma obrigação. E para além das responsabilidades enquanto empregador e o bom senso, tal atitude também impacta na reputação da marca. Basta a gente dar uma pesquisa rápida no Twitter por “SporTV” que veremos muitos comentários sobre isso.
O uso da morte como estratégia de entretenimento.
Grafite, hoje comentarista dos canais Globo, foi atleta de futebol e estava em campo em 2004 quando o jogador Serginho, do São Caetano, teve um mal súbito e não resistiu. É até hoje uma das cenas mais tristes e fortes do esporte brasileiro.
Grafite foi chamado para dar seu depoimento enquanto jogador que vivenciou uma situação parecida. As cenas do Serginho caindo e esbarrando nas pernas do Grafite foram reproduzidas pelo SporTV.
- A quem interessava rever a cena da morte do Serginho no meio da tensão do atendimento de Eriksen?
- Será que foi saudável colocar o Grafite na situação de relembrar um fato trágico em busca da manutenção da audiência?
Na ânsia de possivelmente prender a atenção do público, o canal tratou da morte como um espetáculo midiático.
Decisões imediatas sem planejamento em uma crise é quase sinônimo de erro.
É difícil. O programa precisa ficar no ar, as pessoas querem saber, as informações oficiais são poucas, é preciso criar pautas. Em uma atitude acertada do programa, um médico com experiência em protocolos de atendimentos no futebol foi chamado para ser entrevistado. No entanto, no meio de atitudes ruins uma atitude boa perde o seu protagonismo.
Tomar a decisão na hora é uma responsabilidade gigante e muito muito complexa.
Isso se aplica a muitos contextos e a todo tipo de negócio.
Nesse caso, uma gestão de crise eficiente deveria começar com um planejamento prévio feito a partir das seguintes perguntas: o que pode dar errado durante a transmissão de um jogo de futebol e o que devemos fazer para cada coisa errada que mapeamos? Isso, sem levar em conta os aprendizados de casos passados, como o do Serginho.
As marcas não podem mais ser reféns do improviso.