Se antes as empresas falavam em investir em diversidade por uma mudança social focada na inclusão, atualmente a justificativa financeira também fala alto. De acordo com um estudo da McKinsey de 2017, empresas que investem em diversidade de gênero em suas equipes executivas são 21% mais propensas a ter lucratividade acima da média do que as empresas não investem.
Existem muitas empresas que ainda buscam a melhor forma de trabalhar a inclusão, e consultorias como a MGN, que esteve na RP Week 2017 apresentando cases de grandes empresas, estão na dianteira de um trabalho mais orgânico relacionando empresas e diversidade. Mas a verdade é que a resposta não está somente nas políticas corporativas, e sim nas pessoas. E foi nesta perspectiva que conversamos com Juliana Oliveira, da área de recrutamento da empresa ThoughtWorks.
Juliana é formada em publicidade pela PUCRS. Um dia, depois de vários anos trabalhando em agências, recebeu uma proposta desafiadora: atuar como recrutadora de uma das principais consultorias de Tecnologia da Informação do mundo.
Mas o grande ponto da Thoughtworks não é o que ela faz, e sim como ela faz.
A cultura da empresa é focada na diversidade, e isso tem origem na mentalidade do seu fundador, Neville Roy Singham. “Encorajar a diversidade de pessoas em todas as áreas da empresa” é um dos pilares do negócio, desde o seu surgimento.
Na ThoughtWorks, as responsabilidades são divididas entre todos: desde o recrutamento, até o melhor período de férias, a prospecção de clientes e, até mesmo, como usar as verbas de treinamento ou daquele evento de fim de ano. Tudo isso representa agilidade, termo originado das Metodologias Ágeis que norteiam o desenvolvimento tecnológico em todo o mundo atualmente. E que, aliás, merece ser estudado e aplicado em outras áreas profissionais, em especial as Relações Públicas.
O que Juliana não imaginava era a transformação na qual iria se envolver neste novo cargo e nesta nova profissão: ela se tornou líder no projeto Enegrecer Recrutamento Expresso, iniciativa da empresa para valorização da diversidade.
“O segmento de TI ainda é muito privilegiado e elitizado. Temos um contraponto em nosso país, onde mais da metade da população é negra, e é este o fator que o Enegrecer traz em pauta: onde está a nossa representatividade na área de TI?”, explica Juliana.
A empresa, que já trabalhava muito a questão de gênero, afinal, o número de mulheres na área de TI é bem menor que o de homens, decidiu dar atenção especial à questão racial. Isso é o projeto Enegrecer, fazer uma ação intencional de contratação de pessoas desenvolvedoras de softwares negras, até para desmistificar que não existem pessoas negras capacitadas neste meio.
O Projeto Enegrecer valoriza os profissionais negros na área da Tecnologia da Informação e, mais do que isso, prepara o ambiente de trabalho em que serão inseridos. Em abril de 2018, o Enegrecer Recrutamento Expresso aconteceu em Salvador e foi a primeira ação de um ano em que Justiça Racial será um dos focos da ThoughtWorks Brasil. E essa ação faz parte da campanha Enegrecer a Tecnologia, uma iniciativa da ThoughtWorks Brasil construída por pessoas negras da empresa como resposta ao seu cotidiano impactado pelo racismo ainda velado no mercado de trabalho.
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Conheça mais sobre esta iniciativa na entrevista a seguir.
BLOG RP: Como a sua experiência pessoal colaborou para o projeto?
JULIANA: Já trabalhei em agência de publicidade com mais de 200 pessoas e no meu papel no cargo de executiva de contas eu era a única negra, o restante estava em serviços gerais. Com isso, eu trouxe também a minha experiência pessoal para contribuir com o Enegrecer para valorizar o protagonismo negro.
Para mim esse cenário foi se desenvolvendo, porque quando estava na faculdade por vários semestres eu era a única negra da turma, isso mudou devido a muito amadurecimento e conscientização. Certa vez fiz um curso em que havia uma professora negra que falava sobre diáspora africana, achei muito interessante e decidi que queria botar isso em pauta, foi um processo de me descobrir e qual o impacto que eu deixava, comecei a transformação para colaborar pela causa.
BLOG RP: Quanto tempo levou para realizar a estruturação da ideia na ThoughtWorks?
JULIANA: A ideia surgiu há um ano e o pré-projeto foi desenvolvido em 6 meses para garantir que cada etapa do processo fizesse sentido para todos e, principalmente, para a nossa comunidade negra e não fosse apenas mais uma ação de diversidade, mas sim que causasse impacto e reflexão. A nossa preocupação vai além apenas da contratação, mas também na preparação do ambiente que vai receber essas pessoas para potencializar as fortalezas.
BLOG RP: É preciso fazer uma mudança em todo o contexto de contratação. Como vocês estruturam isso?
JULIANA: Realizamos um trabalho com todos os funcionários, até mesmo os terceirizados, visto que todos são parte da nossa rede e precisam estar inseridos em nossas ações. Nós buscamos conhecer as pessoas por meio das competências e não baseados em um checklist técnico pré-definido, afinal, a técnica se aprende com o tempo. Valorizamos muito a bagagem adquirida ao longo dos anos e as experiências vividas.
BLOG RP: Como aconteceram todos os processos de desenvolvimento do projeto?
JULIANA: Existe o nosso grupo interno chamado “Quilombolas”, que colaborou para o desenvolvimento do projeto, onde discutimos sobre questões raciais.
Além disso, estudamos o cenários nacional para ver quem já desenvolvia um trabalho neste sentido. Foi quando encontramos a PretaLab, que é uma iniciativa da Olabi que acredita no protagonismo das meninas e mulheres negras e indígenas nos campos da inovação e tecnologia como forma de reduzir as desigualdades sociais do país. Nos tornamos parceiros no intuito de somarmos expertises em prol de uma tecnologia mais negra, mais justa e genuinamente inclusiva.
Para entender porquê precisamos desse olhar diverso hoje na tecnologia, basta digitar no Google “Mulher bonita”: você encontra 3 páginas de mulheres loiras, então precisamos falar sobre algoritmo e tecnologia inclusiva também.
BLOG RP: O Enegrecer se estende para além do espaço físico em que se encontra a ThoughtWorks?
JULIANA: Sim, e estamos buscando cada vez mais intensificar isso. Para atingir a toda a comunidade com um espaço para passar conhecimento e criar integração. Nossa intenção era desenvolver um trabalho que fosse além apenas do nosso local físico. Foi neste momento que identificamos Salvador como local ideal para realização do recrutamento expresso, a primeira ação da campanha Enegrecer a tecnologia, visto que é a cidade mais negra do Brasil, onde começa toda a cultura afrobrasileira e analisamos também a abrangência do mercado de TI.
Como o nosso objetivo envolvia a troca de experiências, desenvolvemos o Enegrecer Talks, na noite que antecedeu o recrutamento expresso, que foi uma noite de troca de conteúdos realizada em Salvador só com palestrantes negros falando sobre uma temática técnica. Este evento foi muito bacana e tende a ganhar mais edições.
BLOG RP: Este modelo que vocês desenvolveram também pode ser utilizado por outras áreas?
JULIANA: Sim, no entanto é preciso entender qual a cultura da empresa, quais as necessidades e de que forma trabalhar. Nós desenvolvemos no ramo da tecnologia, mas ele é totalmente aplicável nas demais áreas, basta trocar a lente para mostrar quem tem muitas pessoas que tem conhecimento e produzindo um ótimo conteúdo.
A Juliana Oliveira estará na RP WEEKEND para nos contar muito mais sobre esse projeto incrível! Já garantiu o seu ingresso para o evento? Saiba tudo aqui e inscreva-se!
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